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1,4 milhão de brasileiros têm transtorno de jogo, aponta estudo inédito

Levantamento conduzido pela Unifesp e Uniad mostra que 10,9 milhões de pessoas no Brasil apresentam sintomas de dependência em jogos de aposta, com maior prevalência entre adolescentes e pessoas de baixa renda.

Por Ligado no Sul09/04/2025 10h00
Foto/Freepik

Um estudo realizado pela primeira vez no país mostrou que 1,4 milhão de pessoas já desenvolveram transtornos de jogo, com envolvimento em apostas associado a prejuízos pessoais, sociais ou financeiros. Além disso, 10,9 milhões de brasileiros apresentam sintomas de dependência em jogos de aposta, com maior prevalência entre adolescentes e pessoas de baixa renda.

O inquérito epidemiológico, que entrevistou uma amostra representativa de 16,6 mil participantes com 14 anos ou mais em todas as regiões brasileiras entre os anos de 2023 e 2024, integra a terceira edição do Levantamento Nacional de Álcool e Drogas (Lenad), da Unifesp, divulgado recentemente pelo Observatório Brasileiro de Informação sobre Drogas, do Ministério da Justiça.

Segundo o estudo, 25,9% da população brasileira já apostou ao longo da vida, e 17,6% apostou no último ano. As plataformas digitais, conhecidas como “bets”, já são a segunda modalidade de jogos mais utilizada no país, respondendo por 32,1% – quase um terço – dos apostadores. Em números absolutos, são 9,13 milhões de brasileiros que utilizam plataformas online para jogos.

Mais de um terço (38,4%) dos brasileiros que apostaram no último ano foram considerados em situação de risco ou já são classificados como jogadores problemáticos, segundo a escala PGSI (Problem Gambling Severity Index), instrumento utilizado no estudo que identifica critérios diagnósticos do Transtorno de Jogo – patologia reconhecida pelo Manual Diagnóstico de Transtornos Psiquiátricos.

Os dados apontaram ainda que 4,4% (IC95%: 2,8–6,8) do total de apostadores possivelmente já desenvolveram o transtorno de jogo, o que equivale a 0,8% da população brasileira.

Grupos vulneráveis

Ainda que a proporção de apostadores seja menor entre adolescentes (10,5%), eles têm maiores chances de desenvolver problemas relacionados ao jogo.

Mais da metade dos apostadores com idade entre 14 e 17 anos já apresenta indicação de jogo de risco ou problemático (55,2%, IC95%: 29,6–61,0), taxa maior do que entre os adultos (37,7%, IC95%: 32,8–42,8).

Os usuários das “bets” (plataformas online) também estão mais propensos a desenvolver problemas, com chances quadruplicadas (OR: 4,02; IC95%: 2,83–5,72, ajustado por sexo) de desenvolver o Transtorno de Jogo.

Entre esses apostadores, a proporção de indivíduos com indicação de risco ou problema chega a 66,8% (IC95%: 59,0–73,9), contra 26,8% (IC95%: 22,0–32,1) entre os que não usam essa modalidade de aposta.

Apostadores com renda mensal inferior a um salário mínimo também estão em maior risco. Mais da metade desse grupo já apresenta indicação de jogo de risco ou problemático (52,8%, IC95%: 46,1–59,4), ante 21,1% (IC95%: 13,2–32,1) entre os apostadores com renda superior a dois salários mínimos.

“Os dados do levantamento evidenciam a crescente popularidade dos jogos de aposta no Brasil, impulsionada pelas plataformas online. Além disso, o envolvimento precoce de adolescentes, os altos índices de problemas entre usuários de bets e a relação entre vulnerabilidade socioeconômica e o maior risco de transtorno de jogo reforçam a urgência de políticas públicas que protejam a saúde mental da população”, afirma o psiquiatra Ronaldo Laranjeira, professor titular da Unifesp, diretor da Uniad e presidente da SPDM (Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina).

Segundo ele, é fundamental que, diante do cenário identificado, os gestores do SUS (Sistema Único de Saúde) apresentem modelos eficazes de tratamento para apostadores de risco ou diagnosticados com transtorno de jogo. O diretor da Uniad também alerta para a necessidade de medidas de prevenção por meio de políticas públicas regulatórias.

Recomendações

Diante dos resultados do estudo, torna-se fundamental a implementação de estratégias preventivas que busquem reduzir os danos associados aos jogos de aposta, especialmente entre populações vulneráveis, como crianças, adolescentes e indivíduos suscetíveis ao desenvolvimento de comportamentos de risco.

Com o objetivo de fomentar iniciativas baseadas em evidências científicas para enfrentar esse novo desafio de saúde pública, a equipe do LENAD/Unifesp, em colaboração com pesquisadores do Centro de Pesquisa em Álcool e Drogas do Hospital de Clínicas de Porto Alegre e da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), elaborou um conjunto de recomendações alinhadas a estratégias internacionais reconhecidas por sua efetividade:

1) Regulamentação e supervisão

  • Implementar requisitos mais rigorosos de licenciamento para operadores de jogos de azar online, assegurando transparência e responsabilização na oferta desses serviços (Dash et al., 2024).
  • Assegurar que órgãos regulatórios independentes tenham autoridade para fiscalizar o setor, monitorar práticas comerciais e, principalmente, aplicar sanções quando necessário (Dash et al., 2024; Wardle et al., 2024).

2) Proteção de crianças e adolescentes

  • Garantir a proteção mandatória de crianças e adolescentes contra as apostas, com exigência rigorosa da idade mínima e identificação obrigatória (Wardle et al., 2024).
  • Modernizar sistemas de cadastro e monitoramento, utilizando verificação de identidade biométrica, análise de comportamento e padrões de uso, verificação de documentos com inteligência artificial ou autenticação com selfie (KYC reforçado), além de limites técnicos e de perfil (soft blocks).
  • Integrar conteúdos educativos nas escolas sobre os riscos dos jogos de azar e estratégias para resistir a influências sociais e midiáticas.
  • Reduzir a exposição de menores de idade a jogos de azar, restringindo o acesso, a promoção, o marketing e o patrocínio em canais acessíveis a esse público.

Observação: o marco regulatório das apostas (Lei nº 14.790/2023) ainda não definiu diretrizes específicas de propaganda.

3) Proteção aos grupos vulneráveis

  • Implementar registros obrigatórios de usuários para possibilitar o rastreamento de padrões de uso e intervenções precoces.
  • Criar sistemas universais de autoexclusão, permitindo que indivíduos limitem voluntariamente seu acesso às plataformas.
  • Oferecer ferramentas tecnológicas de monitoramento, como alertas personalizados e bloqueios automáticos com base em comportamento de risco.

4) Financiamento para pesquisa, educação e assistência

  • Estabelecer contribuições obrigatórias dos operadores para um fundo público destinado a financiar pesquisas independentes, campanhas educativas e serviços de tratamento e apoio às pessoas afetadas (Dash et al., 2024).

5) Mudança na abordagem de comunicação

  • Substituir o discurso centrado no “jogo responsável”, que transfere a responsabilidade exclusivamente ao indivíduo, por campanhas educativas que desnormalizem os comportamentos de risco (Livingstone & Rintoul, 2020).
  • Promover campanhas com base científica, focadas na desnormalização das apostas como forma aceitável de lazer, especialmente entre jovens e populações vulneráveis.
  • Exigir transparência quanto aos riscos, incluindo a probabilidade real de perdas e os mecanismos de manipulação utilizados pelas plataformas.

6) Restrição à publicidade de apostas

  • Proibir publicidade de jogos de azar em mídias acessíveis a menores e em horários de ampla audiência.
  • Limitar o uso de figuras públicas, influenciadores e atletas na promoção das apostas.
  • Exigir a inclusão de alertas claros sobre os riscos associados ao jogo, como já ocorre nas campanhas antitabaco.

Recomendações para apostadores (baseadas na United Kingdom Gambling Commission, 2021)

  • Converse com alguém: Se você acha que as apostas estão se tornando um problema, busque ajuda. Falar com alguém pode ajudar a encontrar soluções.
  • Reflita sobre suas motivações: Apostar não deve ser uma forma de lidar com problemas ou dívidas.
  • Monitore sua atividade: Acompanhe a frequência e os valores gastos em apostas.
  • Busque informação de qualidade: Conheça os riscos reais e os mecanismos utilizados pelas plataformas.
  • Defina limites de gasto: Estabeleça um limite claro e realista.
  • Faça pausas entre as apostas: Tire intervalos regulares e, se necessário, utilize bloqueios temporários.
  • Proteja seus dados pessoais: Nunca compartilhe informações sensíveis para abrir contas de jogo.
  • Evite o uso de substâncias durante o jogo: O uso de álcool ou drogas pode prejudicar o julgamento e favorecer decisões impulsivas.
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